O Mar

John Banville venceu em 2005 o Men Booker Prize com este livro.
Um dos melhores romances que li até hoje.

"Noite, e tudo tão silencioso como se não existisse ninguém, nem mesmo eu. Não consigo ouvir o mar, que noutras noites ruge e brame, umas vezes próximo e com um marulhar irritante, outras vezes distante e ténue. Não quero sentir-me assim tão só. Porque é que não voltaste para me assombrar com a tua aparição? Era o mínimo que esperava de ti. Porquê este silêncio dia após dia, noite após noite, interminável? O teu silêncio é como um nevoeiro. Ao princípio, era uma mancha indistinta na linha do horizonte, no minuto seguinte estávamos no meio dela, sem ver e cambaleantes, agarrados um ao outro. Tudo começou naquele dia, depois da tua ida ao consultório de Mr. Todd, quando saímos da clínica e entrámos no parque de estacionamento deserto com todos aqueles carros perfeitamente alinhados, lustrosos como toninhas, sem emitirem um som, nem o mínimo sinal da mulher jovem a martelar o chão com os sapatos de saltos altos. Depois foi a nossa casa que mergulhou num silêncio próprio e logo em seguida os corredores silenciosos dos hospitais, as enfermarias mudas, as salas de espera, até ao último de todos os quartos. Manda-me o teu fantasma. Atormenta-me, se quiseres. Chocalha as tuas correntes, arrasta a tua mortalha pelo chão, subtil e agoirenta como uma Dama Branca. Faz qualquer coisa. Ao menos, eu teria um fantasma."

John Banville in "O mar"